sábado, 10 de maio de 2008

Esquizofrenia

Depois do Cogito cartesiano, muitas águas já passaram por baixo dessa ponte... Após pensadores modernos e contemporâneos colocarem a consciência em função de algo sempre real, sempre existente no mundo real e, portanto, externo, vejo-me na posição de parafrasear Lacan e dizer: penso onde não existo! O que me comprova que de fato existo? Ou o que me dá concretude no sentido de identificar como real o que vejo? Que realidade posso afirmar no mundo ao meu redor? Posso afirmar que as relações que vivo são reais? Dizer que sinto os sentimentos que penso sentir? As pessoas existem mesmo ou são fruto da minha imaginação? Quê, de fato, existe?
Tudo me leva a crer que é exatamente a segunda alternativa. Tudo que construo no meu mundo imaginário só existe na minha imaginação e não existe nada ao meu redor. Então, posso inferir que eu também não passo de uma construção imaginária, um espectro do que talvez deveria ser vida, corpo, alma e pensamento. Uma faísca. Uma luz na escuridão, do nada. Meu corpo é um ser etéreo e sem vida, sem existência em si, não tenho substância. E, se nada existe, como posso inferir alguma coisa?
Sou uma esquizofrênica incurável. Mas apesar de gravitar nesse mundo pertencente à Terra do Nunca – não do País das Maravilhas – posso dizer que desfruto de uma indelével e irredutível liberdade! Uma liberdade tão infinita que nada nem ninguém pode me tolher... Pelo motivo mais óbvio: não há nada nem ninguém. Meu ser incorpóreo e irreal pode então desfrutar da mais ampla liberdade de ação que poderia ser imaginada ou desejada por qualquer um que viesse a existir nesse mundo que não existe. Não há também como qualquer pessoa ou coisa me impetrar mal algum. Em primeiro lugar, porque não existem coisas ou pessoas; em segundo, porque também não existe mal nem bem.
Mas o fato é que esse pensamento quântico que me constitui precisa transitar nesse universo imaginário, de alguma forma, para alguma coisa. Não sei que caminho seguir, ou a que propósito me destino. Nada sei da possibilidade de me construir ou de constituir algo nesse universo sem fim, mas sem início. Sem consistência. Existir onde não sou, ser onde nada existe. Eis a questão.

Um comentário:

Gabriela Melo disse...

Muito interessante o texto!
Nossa!! Que coisa maluca! Mas é, sim, muito interessante!